terça-feira, 18 de agosto de 2020

Da Caixinha de Promessas aos Memes da Internet

Você sabe o que é uma Caixinha de Promessas?

A grande maioria de nós, que estamos neste mundo e acessa, vez e outra, as redes sociais, não somos teólogos que tiveram o privilégio de fazer uma faculdade de teologia. 

Uma das lições básicas do teólogo cristão e que ele aprende em disciplinas específicas é sobre a interpretação bíblica. Estou falando da EXEGESE

Muito mais comum para tantos de nós, talvez seja, a Caixinha de Promessas. Aquelas caixinhas com cartões coloridos contendo, cada cartão, um versículo da Bíblia. A maneira que alguém utiliza pode variar. Grosso modo, a pessoa pode, a cada dia, tirar um cartão e tomar aquele versículo como uma palavra de Deus para ela naquele dia. 


Eu não duvido de algum bem eventual que essa prática possa trazer na vida daquela pessoa. Deus não está limitado aos nossos meios para trabalhar conosco. No entanto, seria muito estranho se um teólogo, depois de passar pelas disciplinas de exegese bíblica, ainda mantivesse sua relação e seu exercício de interpretação bíblica à base da Caixinha de Promessas. 

Depois de aprender, por exemplo, que 

“a exegese é o estudo cuidadoso e sistemático da Escritura para descobrir o significado original que foi pretendido. A exegese é basicamente uma tarefa histórica. É a tentativa de escutar a Palavra conforme os destinatários originais devem tê-la ouvido; descobrir qual era a intenção original das palavras da Bíblia” (Gordon Fee & Douglas Stuart), 

e, praticar isso, a pergunta pelo contexto é sempre um princípio fundamental. 

A boa notícia é que isso pode ser ensinado também às pessoas em geral, não sendo conhecimento exclusivo aos seminários e faculdades de teologia. 

Infelizmente a prática de ler as Escrituras via Caixinha de Promessas parece ter se ampliado e adaptado para a maneira como as pessoas agora leem a realidade em geral. As redes sociais deram contribuição fundamental para isso. O twitter, por exemplo, surgiu como rede social que limitava as postagens aos 140 caracteres. Mesmo com apenas 9% dos tweets chegando a utilizar todos os 140 caracteres disponíveis, a rede social decidiu, em 2017, dobrar a capacidade limite. Agora, ao que parece, em torno de 1% dos usuários chegam a utilizar os 280 caracteres possíveis. 

A "caixinha de promessas' da era das redes sociais, no entanto, chama-se 'meme'. 

O que é um meme? 

Ao que parece, o termo teria se originado com o biólogo evolucionista Richard Dawkins (O gene egoísta, de 1976) que não estava interessado na cultura digital. A ideia, ali, consiste em falar a respeito de algo que se propaga. Faço este resumo para ficarmos no ponto que interessa à nossa abordagem aqui e poder seguir em frente. 

Na internet um meme é um recurso capaz de proliferar uma informação rapidamente. O termo utilizado para isso é 'viralizar'. Se algo viralizou na internet isso quer dizer que fez sucesso, se espalhou, milhares de pessoas estão acessando e compartilhando. Com isso os memes, que podem ser vídeos, gifs, imagens e montagens combinando frases e imagens, são os 'cartões coloridos' da caixinha de pandora... digo, da caixinha de promessas da internet! 

Não importa o contexto. Não importa a notícia. Não importam os fatos. O meme já me instruiu. Não há tempo para ler uma notícia inteira. A 'chamada' postada como 'meme' já é suficiente. Já posso construir meu juízo! Já sei a realidade e como me portar diante dela! 

Desde marqueteiros à serviço dos políticos até aos que estão à serviço das redes de informação e vendas diversos, todos já descobriram o poder dos memes. Se a Caixinha de Promessas não vende mais que a Bíblia, fato é que dá pra ter e ler a Bíblia como se ela mesmo não fosse mais do que isso, uma caixa de promessas.

Como as disciplinas acadêmicas em geral, a teologia também tem os seus memes, ou, se preferirem, frases de fixação, como "texto fora de contexto é pretexto". Os memes da era digital, ao que parece, chegaram para legitimar o pretexto!