sexta-feira, 3 de dezembro de 2021

O PROBLEMA DO MAL

Você já leu o relato do dilúvio e da arca de Noé?

Com o relato do Dilúvio, que podemos ler em Gênesis 6ss., Deus mostrou que não se resolve o problema do mal simplesmente eliminando o outro. 
Soluções defendidas nos dias atuais indicam que essa preciosa lição ainda não foi aprendida. As pessoas continuam identificando o mal de forma equivocada e, assim, lutam contra grupos, etnias, culturas, enfim, "carne e sangue", perdendo de vista o cerne da questão. 
Enquanto uns acham que vão resolver o problema do mal lançando bombas sobre os 'inimigos', outros acreditam que podem implantar um reino de paz e justiça via revolução ou golpe militar. Não demora para que aqueles que ficam, se embriaguem com sua vitória e revelem que, na verdade, nada ainda foi vencido ("Bebeu do vinho, embriagou-se e ficou nu dentro da sua tenda" - Gênesis 9:21). 
Logo nos encontraremos novamente buscando edificar templos, torres e cidades em busca de fama, prestígio e autoglorificação ("Vamos construir uma cidade, com uma torre que alcance os céus. Assim nosso nome será famoso e não seremos espalhados pela face da terra" - Gênesis 11:4). 
O mal (verdadeiro) não permite que o espelho diante de nós revele algo que nos denuncie. E, assim, continuaremos focando no inimigo errado! "Foi ela..."; "Foi ele..." (Gênesis 3.12-13).

quarta-feira, 15 de setembro de 2021

Discípulo de Quem?

Muito se fala de discipulado. O que é discipulado? 

A palavra discípulo ou discipulado, por si só, ainda não diz muita coisa. É preciso perguntar por aquele que o discípulo segue. 

Um discípulo é um aluno, um aprendiz, um seguidor. Assim, alguém pode ser discípulo de Buda, de Maomé, do Profeta Gentileza, do INRI Cristo, do Chico Xavier, enfim, até de pastores e outros líderes que gostam de inflar o próprio ego com seus bajuladores à volta. 

Quando Jesus Cristo orientou os seus discípulos para que eles fizessem discípulos certamente havia algo mais abrangente em jogo. Não se tratava que agora, depois da Ascenção de Jesus, cada discípulo, alçado à condição de apóstolo, deveria sair e formar, cada um, a sua própria seita de seguidores pessoais. 

Fazer discípulos, conforme o modelo de Jesus, sempre consiste em levar as pessoas a 
seguirem o único e verdadeiro mestre que é Jesus. 

Discipulado, assim, não é um mero programa, não se trata de um método de sete ou doze passos. Não se faz discipulado apenas transmitindo conteúdos ou recomendando leituras. O verdadeiro discipulado que consiste em levar pessoas a seguirem a Cristo e, portanto, encontrarem nEle a própria identidade, é um processo contínuo, não tem prazo e nem formatura. 

Nesse sentido, um versículo que precisamos resgatar quando o assunto é discipulado na igreja é João 1.36. Embora possamos falar dos “discípulos de João Batista”, esses o eram apenas na medida em que João se reconhecia um instrumento de Deus. João sabia que Aquele a quem realmente importa seguir é Jesus. Por isso, João não hesita em apontar o verdadeiro mestre e nem se ressente ao “perder” os seus seguidores para o verdadeiro Cristo. 

“João estava ali novamente com dois dos seus discípulos. Quando viu Jesus passando, disse: ‘Vejam! É o Cordeiro de Deus!’ Ouvindo-o dizer isso, os dois discípulos seguiram a Jesus” (João 1.35-37) 

Formar discípulos de Jesus não se resume a gerar seguidores pessoais. Não envolve métodos eprogramas que formam simpatizantes de nossas causas particulares. Não tem a ver com produção em série de “soldados” que marcham conforme nossas ordens. 

O discipulador é sempre alguém maduro o suficiente capaz de apontar para Jesus: "Vejam! É o Cordeiro de Deus!” 

Assim, o discipulador é apenas um instrumento circunstancial nas mãos de Deus que leva o discipulando à maturidade que consiste em ser, ele mesmo, um livre seguidor de Jesus. Alguém capaz de, agora, participar também da tarefa de auxiliar outros a se tornarem seguidores de Jesus. 

O discipulado cristão jamais gera dependência do discipulador, mas, somente de Cristo.

terça-feira, 14 de setembro de 2021

Então disse o Senhor Deus: "Agora o homem se tornou como um de nós, conhecendo o bem e o mal" (Gênesis 3.22)

Quando lemos o relato da Queda, em Gênesis 3, conseguimos, quando muito, nos identificar com o casal de seres humanos que foi enganado pela serpente. A própria palavra 'enganado' já volta a nos iludir e revela que não aprendemos muito depois disso. Continuamos a nos ver como vítimas incapazes de assumirem a responsabilidade pelos seus atos. Foi ele, foi ela, foi o diabo, qualquer um, menos eu! 

A Queda, porém, é tão mais danosa que nos faz ignorar que não só passamos a ser imitadores daquele primeiro casal, fugindo de nossas responsabilidades e dando desculpas esfarrapadas. Além disso, deixamos de buscar e nos orientar por Deus, aquele que nos criou à sua imagem e semelhança, para nos espelharmos na própria serpente. Assim como ela, semeamos a duvida, colocamos a Palavra de Deus sob suspeita, levamos outros ao erro, mentimos e, vejam só, até dizemos a verdade. Esta, porém, sempre misturada ao erro, à mentira, à dúvida, afinal, a verdade só importa como instrumento para manipular, enganar, desviar. São as meias verdades que, no fim, não passam de mentiras completas. 

Foi isso mesmo que Deus disse? Não. Não é bem assim! 

Nas palavras do Reformador Martim Lutero: 

“...a maior tentação foi ouvir uma outra palavra e afastar-se daquela que Deus havia proferido”. 

Depois disso, não queremos mais ouvir qualquer outra voz a não ser a nossa. Já acreditamos piamente na verdade da serpente: “...seus olhos se abrirão, e vocês serão como Deus” (Gênesis 3.5).

sábado, 11 de setembro de 2021

Igreja: preste atenção ao mundo à sua volta!

O chamado para pastorear uma igreja é um chamado para pastorear a comunidade. O que pode parecer óbvio nem sempre o é. Comunidade é algo pelo que se trabalha continuamente. Requer cuidados e atenção constante.

A responsabilidade de pastorear uma igreja vem com a missão de servir a comunidade. As igrejas não são ilhas ou bolhas criadas para isolar os crentes das enfermidades da sociedade. As paredes do templo  não são barreiras protetoras para os problemas da sociedade. Muito pelo contrário - a igreja é chamada para cumprir a missão de Deus no mundo. E, muitas vezes isso significa que as pessoas são enviadas para os desafios mais difíceis e os ambientes mais escuros da vizinhança. Como assim? 

Para o cristão, que vive dentro da narrativa bíblica, não é nenhuma novidade que a queda colocou a criação de Deus numa rota de perigos, problemas, maldades e injustiças. Vivemos num mundo cheio de problemas. A maioria concordará que a igreja deve ser parte da solução, pelo menos em teoria. Quando um pastor prega sobre as soluções para os problemas da comunidade e da cidade, muitos podem até mesmo acenar positivamente. Muitas igrejas têm boas intenções, mas não sabem por onde começar. Como partir para a ação e colocar uma visão cristã, bíblica, em prática? Como uma igreja se torna parte da solução para melhorar a realidade à sua volta?
 
Certamente teríamos uma lista de soluções bem longa se nos dispuséssemos a abrir para sugestões. Cada contexto apresenta uma realidade particular com os seus próprios desafios. Mas, será que haveria alguma solução negligenciada? Algo que a maioria das igrejas não está considerando?

Estamos acostumados com a palavra promoção.  Porém, queremos ampliar o sentido dessa palavra de modo que seja uma maneira prática para a igreja fazer a diferença ali onde se encontra. Por exemplo: a sua cidade possui muitas crianças aguardando por adoção? Adotar uma criança é uma forma de promover um ser humano. Quantas famílias bem estruturadas na igreja poderiam, muito bem, receber mais uma pessoa em sua casa! Pensemos, especialmente, naquelas crianças maiores, que não costumam ser as mais visadas por casais que buscam adotar. 

Quer outro exemplo? Qual é a taxa de desemprego em sua cidade? Muitas igrejas estão repletas de empresários e pessoas influentes. Como esses cristãos poderiam se mobilizar para criar cursos de qualificação? Talvez reduzir a margem de lucro e gerar mais empregos!? Sim, promover pessoas é uma das das maneiras mais negligenciadas de fazer com que sua igreja resolva os problemas da comunidade. Quando perguntamos pelas crianças, pelos moradores de rua, pelas mães que não tem onde deixar os filhos enquanto trabalham, pelas pessoas desempregadas, imediatamente nos conectaremos ao cerne dos problemas da comunidade. 

A igreja de Jesus Cristo é chamada a invadir os ambientes mais difíceis deste mundo e fazer a diferença. Não é uma tarefa simples. Ninguém disse que seria! Há, porém a promessa de que nem mesmo as portas do inferno prevalecerão diante de uma igreja ousada e que avança no poder do Espírito Santo. 

A igreja é chamada a cuidar dos mais vulneráveis. Promover pessoas é uma forma de ser pró-vida e pró-justiça. As Escrituras repetidamente nos lembram do estrangeiro, da viúva e do órfão.  Colocar-se a favor da vida e da justiça gera movimento, dá trabalho, trará incômodo. Ser igreja, porém, envolve criar uma cultura de sacrifício, de serviço. Ser pais adotivos, por exemplo, implica perder privacidade, dinheiro, segurança e muito sono. O sacrifício é exigido desde o momento em que você começa, se inscrevendo no processo de adoção.

Ser igreja envolve formar comunidade. As crianças e os mais vulneráveis passam a ser responsabilidade de todos. Em Cristo, o ser igreja implica uma nova grande família. Quantas pessoas mais podemos acolher?

Ainda sobre o aspecto específico da adoção, talvez nem todas as casas estejam preparadas. No entanto, existem outras maneiras de acolher. Existem crianças e jovens que poderiam se sair melhor em seus estudos, mas, não tem as condições ideias. Como ajudar? Fato é que a pessoa que está inserida numa igreja não estará sozinha diante desses e outros desafios. 

Quando uma igreja passa a prestar mais atenção à realidade à sua volta ela também sente-se chamada a arriscar mais. Só quando a igreja descobrir meios de promover pessoas ela será uma benção na sua realidade, gerando vida e transformação. 

domingo, 29 de agosto de 2021

Discipulado é Relacionamento com Jesus

Quando se trata de seguir a Jesus, será que estou convencido de que eu já dei o passo? Será que meu voluntarismo me permitem o direito de cumprir uma série de preceitos em lugar de um relacionamento direto com Jesus? Será que eu posso me considerar justificado e bom porque decidi dedicar algumas horas da semana à Jesus? Talvez o meu envolvimento com uma série de compromissos religiosos me forneçam a ilusão de que já sou um bom discípulo!? Talvez eu acredite que um compromisso total venha depois de eu cumprir uma série de exigências e obrigações com a igreja!? Quem sabe, eu esteja convencido de que estar na multidão já seja o suficiente. Posso continuar a ditar o ritmo. Faço a minha agenda e peço que Deus a abençoe. Eu sigo, mas, primeiro, eu tenho umas coisinhas que preciso decidir! 

Lembrando outro episódio, quando Jesus lançou seu convite, deparamo-nos com uma resposta radical: “Passando por ali, viu Levi, filho de Alfeu, sentado na coletoria, e disse-lhe: ‘Siga-me’. Levi levantou-se e o seguiu” (Marcos 2. 14). 

Quanta coisa Levi deixou naquele momento para seguir quem lhe convocava!? Poderia ter dado inúmeras e plausíveis justificativas. Como deixar seu trabalho ali, em pleno horário de expediente? Quem o substituiria? Havia ainda repasses a fazer e comissões para receber. O texto, no entanto, diz simplesmente que Levi levantou-se e o seguiu. 

Nas palavras de Dietrich Bonhoeffer, 
"o ser humano que foi chamado larga tudo quanto tem, não para fazer algo especial, mas simplesmente por causa daquele chamado, porque, de outro modo, não pode seguir os passos de Jesus”. 

O único conteúdo no discipulado de Jesus é Ele mesmo. 

O que é o discipulado? 

Discipulado cristão é comprometimento com uma pessoa: a pessoa de Jesus Cristo. Começa, portanto, com um relacionamento com Ele.

quinta-feira, 26 de agosto de 2021

Discipulado Não é Para Relutantes

Estamos tratando sobre três possíveis perfis de candidatos ao discipulado com Jesus Cristo. Além do voluntário e do legalista, sobre os quais escrevemos nos textos anteriores, há ainda um terceiro personagem no relato do Evangelho de Lucas 9. 57-62. Este, ao que parece, ouvindo a conversa anterior de Jesus com os outros dois, entra com muita boa vontade e se dirige a Jesus, dizendo: “Vou seguir-te, Senhor, mas deixa-me primeiro voltar e me despedir da minha família” (Lucas 9.61). 

Estamos diante de uma espécie de combinação entre os dois personagens anteriores. Este se prontifica. Ele quer, mas, já embute uma justificativa na sua fala. Ele quer... mais ou menos...! Há um 'porém'. Poderíamos chamar este de o seguidor relutante. Ele, assim como o legalista, tem uma boa desculpa para procrastinar. Mas, trata-se apenas de um ato de cortesia. Não é que ele deseja ficar até o final da vida com os pais. Quer apenas se despedir. Que mal pode haver nisso!? Ele quer apenas deixar as coisas em ordem. Encaminhar os negócios primeiro. No máximo terminar aquele empreendimento que, afinal de contas, não poderia ser deixado pela metade. Talvez tivesse alguma propriedade que precisaria vender! 

Em todos os três casos, chama a atenção que a resposta de Jesus é bastante dura! O que isso revela? Uma coisa muito simples: nenhum deles estava sendo realmente sincero diante de Jesus. Se houvesse sinceridade a reação de Jesus seria outra. Não temos como saber ao certo! O hesitante ou relutante se caracteriza por colocar suas próprias condições. 'Eu te sigo, desde que...' O relutante acha que pode impor condições, ele procura apresentar a sua própria programação de como as coisas deveriam ser. Ele impõe critérios que possam justificar as coisas à luz da razão e da ética. Ele deseja estabelecer o seu próprio tempo e a agenda. 

Muitas vezes eu também sou assim. Seria mais fácil ser um discípulo de Jesus se eu pudesse manter o controle de certas coisas. Cabe a reflexão: Você tem conseguido deixar Jesus tomar conta de tudo? Entregou a ele sua agenda? Sua carteira? Seu tempo (relógio)? Suas relações (celular, WhatsApp, família)? Seus negócios (trabalho, empreendimentos)? O que te prende? O que ainda te deixa dividido, relutante, indeciso? Será que eu sei o que realmente quero? Por que hesito?

Qual é a resposta de Jesus ao relutante? “Ninguém que põe a mão no arado e olha para trás é apto para o Reino de Deus” (Lucas 9.62). Pegou? Então agarra firme e vamos em frente! Nas antigas tecnologias de arado, se o lavrador se distraísse ou ficasse olhando para trás, seria impossível fazer um trabalho decente e manter uma linha reta. O discipulado implica um compromisso radical, decidido, sem vacilar... Há apenas um único Senhor e o foco agora é ele e somente ele. Discipulado é relacionamento com Jesus! O que nós temos colocado entre o chamado de Cristo e a nossa obediência incondicional? O que tem me atrapalhado?

quarta-feira, 25 de agosto de 2021

Discipulado Não é Para Legalistas

No texto anterior falamos que o discipulado não é para voluntários. Baseado no texto de Lucas 9. 57-62 diríamos que o discipulado também não combina com o legalismo. O legalismo ou a religiosidade, quando colocados em primeiro plano, sempre será obstáculo e desculpa para um verdadeiro compromisso com Jesus. 

Depois de Jesus tratar com o voluntário, surge um segundo personagem. A este Jesus estende o convite: “siga-me” (v. 59). É uma situação diferente daquela diante do voluntário. Aqui Jesus vê alguém e lança o convite. A iniciativa é de Jesus. 

Aquele homem era mais um dos seguidores casuais de Jesus. Estava ali, na multidão. De repente, Jesus lhe permite um encontro pessoal e direto. Esta pessoa, num primeiro momento, parece não ter dúvidas de que se trata de um convite e tanto. Não poderia negá-lo! Ele sabe que não basta responder algo do tipo, “mas, Senhor, eu já o sigo!” Não. Ele sabe que o negócio agora é diferente: "Ele olhou pra mim! Ele me viu! Ele se dirigiu diretamente a mim! Ele me identificou e me chama dentre a multidão!" “Caramba! Agora a coisa ficou séria!” 

Qual foi, no entanto, sua resposta ao ‘siga-me’ de Jesus? “Senhor, deixa-me ir primeiro sepultar meu pai” (Lucas 9.59). 

Para Dietrich Bonhoeffer este homem se encaixaria no perfil do legalista. Se o primeiro candidato a discípulo é o voluntarioso, este, agora, é o legalista. Por que? O judaísmo sempre enfatizou fortemente a importância da obrigação com os pais. Aquele homem, portanto, parece apresentar uma justificativa legítima para adiar sua resposta ao convite de Jesus. Havia uma obrigação a ser cumprida! 

É evidente que não estava acontecendo um velório naquele exato momento. Se assim fosse, aquele homem não estaria ali, às voltas com Jesus, mas, envolvido com os preparativos de um funeral. Mas, que resposta foi aquela, então? O que ele realmente estava dizendo era que precisava esperar a velhice e a morte dos pais. Teria que viver para cuidar deles. E, só depois, regressaria para atender satisfatoriamente o desafio de Jesus. ‘Senhor, eu não posso ser seu discípulo enquanto meu pai ainda estiver vivo’. Aquela resposta passava um ar honrado, piedoso, até mesmo justo. Como poderia ser tão irresponsável a ponto de abandonar a família para seguir Jesus!? Certamente nem é isso que Deus requer! Mas, por quanto tempo ele adiaria uma resposta ao convite de Jesus!? O que tudo o mais haveria de cumprir antes de poder tornar-se um discípulo de Cristo? Quantas justificativas podem ser dadas para adiar um compromisso total!? 

Você já parou para imaginar o quanto pode estar entre a multidão que se ocupa com as doutrinas, os estatutos e burocracias eclesiásticas de modo que pode estar utilizando muitas destas coisas para adiar um compromisso radical com Jesus!? O quanto estamos envolvidos com as coisas de Deus sem nos deixarmos envolver pelo próprio Deus!? Nós nos damos por satisfeitos por já carregarmos um rótulo de Cristão, por termos sido batizados, sermos frequentadores dos programas da igreja... Acreditamos estar envolvidos em mudar o mundo sem, no entanto, deixar que Deus mude a nós mesmos.

Transformamos nossa vida cristã num conjunto de preceitos e regras, num seguir de certas tradições... Estamos convencidos de que existem certas coisas que precisamos cumprir. Afinal, é preciso fazer certo as coisas certas! Como reagiremos se, de repente, Jesus nos identificar em meio a todo serviço religioso com o convite: ‘Ei, você, siga-me!’ Talvez você responda, orgulhoso: 'Não, pois eu já faço parte de um programa de discipulado!'

São dois os riscos que envolvem o legalista: o primeiro é confundir seu legalismo, sua capacidade de seguir direitinho as leis, com o discipulado que se caracteriza com o seguir a Jesus, deixando transforma-se à semelhança da revelação humana em Cristo. Achar que por viver conforme um conjunto de regras e doutrinas já é um bom cristão e isso basta. O segundo risco é substituir aquele que realmente é capaz de salvar por algo que depende de si mesmo: seu apego e capacidade de seguir leis que lhe passam um falso sentimento de poder, conhecimento e autonomia. 

Bonhoeffer diria que o legalista coloca o cumprimento às leis acima da obediência ao chamado de Jesus. Ignoramos, assim, que sobre aquele a quem Jesus chamou, a lei já não possui mais qualquer direito. 

Qual foi a resposta de Jesus ao legalista? “Deixe que os mortos sepultem os seus próprios mortos; você, porém, vá e proclame o Reino de Deus” (Lucas 9.60). Mais uma vez, a exemplo do que aconteceu com o voluntário anteriormente, Jesus pega pesado. Palavras duras! 

Eu sou do estado do Espírito Santo. Quando meu pai adoeceu e, posteriormente veio a falecer, eu residia em Pelotas, no Rio Grande do Sul. Há quase 2.500 Km eu não pude acompanhar esse processo. Sequer fui ao sepultamento. Eu sei o quanto é complicado! Eu gostaria de encontrar palavras para amenizar um pouco essa fala de Jesus! Mas, só piora! Quando eu ouço Jesus dizendo que “se alguém vem a mim e ama o seu pai, sua mãe, sua mulher, seus filhos, seus irmãos e irmãs, e até sua própria vida mais do que a mim, não pode ser meu discípulo” (Lucas 14.26), não me restam dúvidas de que sim, há um preço! 

O discipulado tem o seu custo para quem se entrega totalmente. Mas, quem encontra a vida, não se amedronta nem se ocupa mais com a morte. O discípulo é um mensageiro do reino de Deus. O discípulo sabe que encontrou a vida. Por mais justificáveis que pareçam nossas desculpas, nada que se possa imaginar perdido por seguir a Cristo é de fato uma perda!

terça-feira, 24 de agosto de 2021

Discipulado Não é Para Voluntários

Quem pode ser um discípulo de Jesus?

Já nos textos anteriores iniciamos uma conversa a respeito de um tema recorrente entre os cristãos: o discipulado. Embora possamos encontrar diversas maneiras de interpretar e definir o discipulado, fato é que não há como entender melhor seu significado do que quando decidimos olhar para Jesus. Refletindo a respeito da passagem bíblica de Lucas 9.57-62, o teólogo Dietrich Bonhoeffer nos auxilia na identificação de três candidatos ao discipulado que encontravam-se entre a multidão que costumava juntar-se em torno de Jesus. Vamos analisar com mais detalhes estes três perfis que o texto nos apresenta! 

O primeiro deles poderíamos caracterizar como o voluntário. Aquele primeiro homem, conforme nos relata o texto, chega a Jesus e diz: “Eu te seguirei por onde quer que fores” (Lucas 9.57). O destaque, aqui, está exatamente no fato de que não houve um chamado aparente de Jesus. O homem surge como alguém que se voluntaria a seguir Jesus. Temos, portanto, um primeiro perfil de cristãos que confundem o discipulado com algo cujo a iniciativa pode partir de si mesmo. É o voluntário. Aquele que se prontifica. 
Seria injusto se eu agora quisesse julgar as motivações daquele homem. Pode ser que sua motivação fosse até sincera. De tudo que viu e ouviu, seguir esse Jesus poderia ser uma aventura interessante. Sua causa é nobre e fazer parte disso certamente é algo bom. Quem não gostaria de ser identificado como alguém que se colocou 'do lado do bem'!? 

Você que é líder ou pastor numa igreja local, imagine sua reação se algum estranho chegasse e manifestasse o desejo de integrar a sua comunidade. Certamente você ficaria feliz e faria de tudo para receber bem essa pessoa. Faria de tudo para incluir ela e fazer com que se sentisse bem. Quem imaginaria uma repreensão!? Alguém pensaria em dizer algo que pudesse afugentar essa pessoa? Você pensaria em criar alguma dificuldade para este homem que se prontifica tão diretamente? 

A resposta de Jesus parece indicar que ele não estava assim tão interessado em voluntários dispostos a estarem com ele em alguns bons momentos: “As raposas têm suas tocas e as aves do céu têm seus ninhos, mas o Filho do homem não tem onde repousar a cabeça” (Lucas 9.58). Jesus pega pesado com o voluntarismo: Você tem certeza daquilo que está dizendo? Jesus dá a real! Há momentos que seguir a Cristo implicará em viver de forma mais desconfortável à vida de muitos animais. Pouco antes, Jesus fora impedido de atravessar a região de Samaria. Ele já fora expulso da Sinagoga. Além de críticas, rótulos e ameaças verbais, Jesus logo experimentaria a mais dolorosa violência em seu próprio corpo! Ser um discípulo não é coisa para quem tem aspirações de grandeza, de poder e status conforme os valores mundanos.

Em tempos de bonança pode ser muito fácil seguir Jesus, figurar entre aqueles que se declaram cristãos, desfrutar de certo status, passar um ar de piedade e compromisso. Jesus, no entanto, busca discípulos legítimos, dispostos a uma caminhada de risco. Mais adiante, no capítulo 14 de Lucas (v. 25ss.) Jesus mais uma vez chamará a atenção para que se calcule bem o preço do discipulado. Jesus espera por um compromisso radical! Discipulado não é voluntarismo. Discipulado não começa com um chamado a si mesmo. Discipulado é sempre uma resposta ao chamado de Jesus Cristo. 

O voluntário até pode ser muito sincero em seu impulso que o leva a se dispor. Mas, Jesus quer uma resposta consciente. Não podemos nos deixar levar pelo mero entusiasmo, pela moda, porque se dizer gospel ou cristão agora é pop, porque meus amigos fizeram, porque tá todo mundo seguindo, porque abriu uma "church" descolada na cidade ou coisas assim! Não basta ficar impressionado por Jesus! Segui-lo implica em renúncia e abnegação. Se segui-lo, ele vai podar algumas coisas na sua vida! Ah, você quer? Tem certeza? “As raposas têm suas tocas e as aves do céu têm seus ninhos, mas o Filho do homem não tem onde repousar a cabeça”. Esta foi a resposta de Jesus ao voluntário. Andar com Jesus trará consequências, as mais diversas!

sábado, 21 de agosto de 2021

Qual é a Sua Desculpa?

Os textos anteriores nos conduziram ao tema do discipulado. Sem dúvida um assunto recorrente na igreja. Existe um texto bíblico que nos apresenta algumas questões importantes na reflexão a respeito do tema do discipulado. Estou falando de Lucas 9. 57-62. 

Quando andavam pelo caminho, um homem lhe disse: "Eu te seguirei por onde quer que fores". Jesus respondeu: "As raposas têm suas tocas e as aves do céu têm seus ninhos, mas o Filho do homem não tem onde repousar a cabeça". A outro disse: "Siga-me". Mas o homem respondeu: "Senhor, deixa-me ir primeiro sepultar meu pai". Jesus lhe disse: "Deixe que os mortos sepultem os seus próprios mortos; você, porém, vá e proclame o Reino de Deus". Ainda outro disse: "Vou seguir-te, Senhor, mas deixa-me primeiro voltar e me despedir da minha família". Jesus respondeu: "Ninguém que põe a mão no arado e olha para trás é apto para o Reino de Deus". 

Jesus está, como de costume, envolvido pela multidão. Acontecem, então, algumas conversas de alguns destes personagens com Jesus. Esta conversa ocorre ao longo do caminho. Jesus havia manifestado que seu destino nessa caminhada era Jerusalém (Lucas 9.51). Um imbróglio envolvendo os samaritanos fez com que se dirigissem a outro povoado. Ao longo desse caminho é que Jesus é interpelado por três candidatos ao discipulado. 

O que chama a atenção nesta passagem é que todos os três homens estavam entre a multidão em torno de Jesus. E, em algum momento, todos se viram face a face com Jesus Cristo. Até aquele momento, talvez, tivessem ouvido falar de Jesus..., quem sabe o tivessem visto de longe...! Pode ser que até já tivessem conversado com alguém outro mais chegado de Jesus! Eles, certamente, já nutriam admiração por aquele jovem galileu! No entanto, chegou o momento de um confronto para valer! Aquele momento de deixar a multidão e tornar-se um discípulo de verdade. 

Para o teólogo e mártir luterano Dietrich Bonhoeffer, “cristianismo sem discipulado é sempre cristianismo sem Jesus Cristo”. Portanto, o discipulado implica num encontro e um confronto com a pessoa de Jesus. As consequências desse encontro são inevitáveis! Estar diante de Jesus implica mudanças radicais. Será que estamos dispostos?

quinta-feira, 19 de agosto de 2021

Graça Barata x Graça Preciosa

Dietrich Bonhoeffer
No dia 4 de fevereiro de 1906, em Breslau na Alemanha, nasceu uma criança que seria batizada com o nome de Dietrich Bonhoeffer. Teve uma irmã gêmea, Sabine e, ainda, outros numa casa com oito filhos. Aquele menino cresceu, formando-se em teologia em Berlim, em 1927. Logo descobriria que as coisas se tornariam difíceis em seu país. 

Dietrich tornou-se um pastor luterano e professor universitário. Doutorou-se em teologia pela Universidade de Berlim. Quando a ameça nazista já começava a ser identificada por muitos como uma ameça, Bonhoeffer surgiu como oponente ao sistema de Hitler. Foi membro fundador da Igreja Confessante, contrária à política nazista. 

Junto com outros teólogos, Bonhoeffer foi um dos mentores e signatários da Declaração de Barmen, uma confissão contendo seis teses contra a ideologia nazista. Bonhoeffer foi preso em Abril de 1943 por ajudar judeus a fugirem para a Suíça. Em 9 de Abril de 1945, três semanas antes que as tropas aliadas libertassem o campo, foi enforcado, junto com um irmão e dois cunhados. 

As diversas publicações deixadas por Bonhoeffer podem ser hoje encontradas e lidas também em português. Num destes livros, cujo título traduzido é "Discipulado", este pastor tematiza, na introdução, a importância de discernir entre a graça preciosa e a graça barata. Assim, a graça barata seria a
compreensão da justificação do pecado. Já a graça preciosa seria a compreensão da justificação do pecador. Em suas palavras, “a graça barata é a graça que nós dispensamos a nós próprios”. Sem dúvida um entendimento que a igreja de nossos dias ganharia em resgatar e compreender. 

Como motivação para aprofundamento e estudo da obra de Dietrich Bonhoeffer, deixo mais uma citação de sua pena: 

A graça barata é a pregação do perdão sem arrependimento, é o batismo sem a disciplina comunitária, é a Ceia do Senhor sem confissão dos pecados, é a absolvição sem confissão pessoal. A graça barata é a graça sem discipulado, a graça sem a cruz, a graça sem Jesus Cristo vivo, encarnado”

quarta-feira, 18 de agosto de 2021

E Se Seguissem Você!?

Por volta de 2014, quando meus filhos tinham 3 e 6 anos de idade, estávamos residindo em Curitiba. Eu saía com as crianças no portão e, chegando à rua, algo chamou a atenção delas. Duas pessoas estavam passando. Estas pessoas trajavam roupas idênticas e, até mesmo a mochila que carregavam era semelhante. Ambas também ostentavam um crachá no peito. Tratava-se de uma dupla de missionários da Igreja dos Santos dos últimos Dias (Mórmons), comum na maioria das cidades brasileiras. 

Por alguma razão, aqueles dois jovens despertaram a curiosidade, especialmente da Sophia. Ela perguntou o que eram aquelas pessoas. Eu, então, tentei explicar para ela. Disse que eram pessoas que saíam por aí falando do Deus no qual eles acreditam. Ingenuamente imaginei que uma criança, naquela idade, talvez ficaria satisfeita com esse tipo de resposta. Afinal, desde bebês, elas convivem com pais que confessam a Deus, possuem livros e Bíblias em casa, contam histórias sobre Deus, frequentam e as levam a igreja e etc.. 

Mas, a Sophia não se deu por satisfeita. Perguntou se o Deus daquelas pessoas era o mesmo Deus que a gente acredita. Eu comecei a perceber que estava numa enrascada. Procurei responder com algo do tipo: bem, eles não acreditam exatamente como a gente, há algumas diferenças... E, antes mesmo que eu pudesse continuar ela interrompe: o deus deles é uma estátua? Lá estava eu, me contorcendo para tentar explicar: não exatamente, Sophia... Foi então que o Henrique, até aquele momento calado, mas não desligado da conversa, percebendo meu malabarismo e toda a dificuldades para oferecer uma resposta satisfatória, interrompeu abruptamente com uma sugestão brilhante: Pai, por que a gente não segue eles, daí a gente vai ver o deus deles!? 

Eu já contei esse episódio algumas vezes e quase sempre fica como mais uma dessas curiosidades engraçadas da relação pais e filhos, especialmente filhos pequenos que vivem a aventura de descobrir o mundo. Como cristão, no entanto, eu jamais pude evitar de lembrar repetidas vezes da palavra de Jesus a respeito das crianças. Uma interpretação possível é que Jesus lembra aos adultos de que, além de ensinarmos, devemos prestar atenção a elas, as crianças, pois também tem muito a nos ensinar, aos adultos. 
Hoje, já passados sete anos daquele episódio, eu costumo me lembrar especialmente da sugestão do Henrique, então uma criança com pouco mais de 3 anos de idade: “Pai, por que a gente não segue eles, daí a gente vai ver o deus deles!?” Eu não explorei com o Henrique, na época, o que exatamente ele tinha em mente ao propor aquilo. Talvez tenhamos dado algumas risadas e seguimos nosso caminho. Os dois estavam mais interessados no parquinho para onde nos dirigíamos. 

A imaginação de uma criança é algo realmente incrível! Mas, hoje, quando me pego refletindo sobre algumas coisas das Escrituras, especialmente sobre o discipulado, uma pergunta me assalta: Que tipo de Deus as pessoas descobririam se resolvessem me seguir?

sábado, 14 de agosto de 2021

Já tenho a visão, só falta a estratégia. Por onde começar?

Muitos pastores e líderes de igrejas estão empenhados em difundir e estabelecer uma visão. Mas, será que eles tem uma estratégia para isso? 

Se eu decidir alcançar a lâmpada que preciso trocar em meu escritório, busco a escada que tenho guardada na garagem. Só assim poderei alcançar o forro, retirar a lâmpada queimada e instalar uma nova.

Muitas vezes tenho a sensação de que nos comportamos como quem deseja uma sala mais iluminada, porém, esperamos que a lâmpada fique mais potente por si só, ou, que a qualquer momento, alguém virá e instalará uma luz mais forte. 

Por mais simplista que esse exemplo possa parecer, ele nos ajuda a entender que para alcançarmos os nossos objetivos será necessário planejamento e uma estratégia. Se a minha escada e seus degraus representam o caminho para alcançar a lâmpada, uma estratégia é o caminho para a visão. 

Talvez você já tenha clareza quanto à visão para a igreja, mas, esteja encontrando dificuldades para traçar um caminho até lá. Para que você possa criar uma estratégia que leve a sua equipe a alcançar os objetivos traçados, será necessária começar se perguntando 'como'? 

Como eu conseguirei uma luz mais forte para o meu escritório? 
Como alcançar a visão estabelecida para a igreja? 

Traçar uma estratégia nada mais é do que traçar um plano, um passo a passo que te levará na direção desejada. 

Estabelecer metas, objetivos e definir uma visão é a parte fácil do processo de planejamento. O grande desafio consiste em pensar estrategicamente. 

Você já tem uma ideia para onde ir? Ótimo. Você está certo de que está seguindo a direção correta para chegar lá? Você possui uma estratégia para alcançar os objetivos? Sim, é lá que eu quero chegar! Mas, como? 

Se você já se envolveu em algum processo de planejamento já deve ter percebido a importância de algumas peguntas chave na implementação estratégica: 

Porquê? 
O quê? 
Onde? 
Quando? 
Quem? 

Você já sabe por qual motivo deseja que algo seja feito. Pensar estrategicamente consiste em saber também como será feito, quem fará, quando e em quanto tempo. 

O macro num planejamento consiste em desenvolver o nível estratégico que inclui missão, visão e valores. A implementação que garantirá que o planejamento saia do papel, no entanto, dependerá de uma estratégia clara, com um plano de ação bem delineado. Consiste em definir metas e objetivos. Atribuir responsabilidades e definir prazos. Estabelecer cronogramas e processos de monitoramento. 

Há também outro fator determinante no planejamento e na busca por se atingir os objetivos traçados. A execução de um planejamento envolve outras pessoas. Equipe. Logo, a comunicação é fundamental. Comunicar bem faz arte da estratégia.

Quando várias pessoas estão envolvidas num mesmo projeto é indispensável que haja clareza na comunicação. Não basta comunicar uma vez a visão. É preciso repetir, relembrar, orientar ao longo da jornada. 

A importância da comunicação é também importante porque é comum que as pessoas se empolguem com uma ideia no começo. Mas, as coisas tendem a esmorecer quando não se sabe mais como as coisas estão seguindo. A equipe precisa ser lembrada de que são uma equipe e que estão envolvidas em algo maior. 

Se estratégia sem visão pode acabar em mero ativismo, a visão sem uma estratégia gera apenas frustração. É melhor ter uma visão modesta, porém, com uma super estratégia do que ter uma visão fantástica, mas, sem uma estratégia.

domingo, 18 de julho de 2021

Você é um Líder Atencioso ou Apenas Curioso?

É realmente difícil imaginar um ser humano que não seja curioso. A curiosidade é boa. Nos impulsiona a querer saber e descobrir coisas novas. Fazer perguntas está entre as principais características da comunicação humana. 

Outro dia deparei-me com um texto do pastor Sam Rainer, da West Bradenton Baptist Church no Estados Unidos. Ele falava sobre a diferença entre pastores atenciosos e pastores curiosos. Seu argumento é de que é melhor ser atencioso. Não é difícil concordar com Sam nesse sentido. Vejamos algumas de suas principais colocações. 

As pessoas fazem perguntas. No caso, tanto pastores curiosos quanto atenciosos fazem perguntas sobre a sua equipe de trabalho e também a respeito dos membros da igreja. Especialmente quando parece que algo estranho se apresenta. De repente alguém 'desaparece', ouve-se de algum caso de doença, rumores de divórcio, e, assim por diante. Problemas com membros da igreja certamente devem receber a atenção do líder da igreja local. 

Fazer perguntas, portanto, é fundamental para obter informações que servirão de subsídio para uma boa liderança, planejamento e gestão da igreja. Fazer perguntas faz parte das boas qualidades de um líder. 

Um pastor apático ou indiferente certamente será taxado de um pastor ruim. Mas, qual seria a diferença entre uma investigação curiosa e uma investigação cuidadosa? 

Sabemos que quanto maior uma igreja ou organização tanto mais difícil será para a liderança acompanhar individualmente cada pessoa que faz parte dela. A questão não estaria tanto no quanto um líder ou pastor é capaz de investir a sua atenção em cada indivíduo, mas, na sua postura geral. 

Enquanto um líder atencioso deseja ouvir, o líder curioso quer apenas obter informações. 

O pastor atencioso busca compreender o membro para melhor servi-lo. O pastor curioso se interessa pelas informações que lhe digam se uma pessoa pode ou não servir em algum ministério da igreja. 

Enquanto o pastor atencioso se preocupa com a pessoa, o curioso pode estar preocupado apenas com a gestão da organização. 

Líderes atenciosos se preocupam e carregam um fardo autêntico por se interessarem pela vida de seus membros. Por outro lado, um pastor curioso deseja apenas saber o que está acontecendo. A diferença está na preocupação em "como eu posso ajudar" para "me dê as informações para que eu possa tomar a melhor decisão". 

Um líder atencioso acompanha seu membro ou colaborador de perto para ajudá-lo a melhorar. Um líder curioso, por sua vez, pode acompanhar a equipe de perto apenas com foco nas decisões operacionais. 

O pastor Sam Rainer destaca algo que é preciso considerar nesse tipo de abordagem. A curiosidade é um traço importante de toda a liderança. Cabe ao pastor, líderes e gestores manterem a capacidade de fazer perguntas. Liderar uma organização requer tomada de decisões e estar bem informado é fundamental nesse processo. A curiosidade é importante. 

O ponto é que há uma diferença entre pastorear vidas e simplesmente gerir uma instituição. Uma pessoa pode fazer as duas coisas. Nesse caso, deverá manter um equilíbrio saudável entre atenção e curiosidade. 

As pessoas começam logo a perceber se o seu pastor realmente se importa com elas ou se está apenas interessado em usá-las para objetivos operacionais na igreja e no ministério. Nas palavras de Sam Rainer, 

"bons líderes se preocupam tanto com a organização quanto com os indivíduos dessa organização". 

Encontrar esse equilíbrio é um desafio constante a que todo pastor deve permanecer atento. A organização e a gestão devem estar à serviço do rebanho de Cristo.

sábado, 19 de junho de 2021

O Que Deus Deseja Nos Revelar Por Meio das Escrituras?

Encarar o desafio de escrever sobre a Bíblia é saber que você está entrando numa seara de terras pantanosas, traiçoeiras, inglórias. Não que a Bíblia em si seja tudo isso. Estou me referindo ao mundo das informações a respeito das escrituras. 

A história da hermenêutica revela que não existe unanimidade. Muitas divisões e o surgimento de novas denominações cristãs, inclusive, se devem à divergências em torno da maneira como se lê e interpreta determinadas passagens da Bíblia. 

Quem estuda teologia, principalmente aqueles que passaram por alguma faculdade tendo acesso ao formalismo da disciplina, provavelmente já ouviu falar do 'fio vermelho' das escrituras. O que geralmente os professores de teologia querem dizer é que existe um tema que perpassa toda a Bíblia. Não temos nenhum motivo para discordar disso. De fato, entendemos que há um enredo amplo que é possível discernir ao longo de toda a Bíblia. 

Quando nós captamos essa mensagem central, conseguiremos até mesmo compreender melhor a experiência pela qual passou Saulo, depois Paulo, quando Ananias impôs as mãos sobre ele: "Imediatamente, algo como escamas caiu dos olhos de Saulo e ele passou a ver novamente" (Atos 9.18). 

Embora Lucas relate que Paulo passou a ver novamente, fato é que ele jamais viu o mundo da mesma maneira que antes. Sua vida mudou. Suas motivações mudaram. 

São várias as percepções possíveis diante das escrituras. Um livro extenso demais, antigo demais, com autores demais, com gênero literário multifacetado, contando histórias fantásticas que não se encaixam numa era científica, tecnológica e racional. Ainda assim, a Bíblia continua sendo o livro mais lido e mais vendido no mundo. 

Como ler e compreender essa verdadeira biblioteca permanece um desafio. A experiência que muitos tem com a Bíblia se reflete na Igreja, na vida e na experiência de muitos cristãos. Incoerência, fragmentação, literalismo, são marcas de uma experiência seletiva com a revelação bíblica. Temos a Bíblia, como livro impresso, utilizada desde como um fetiche, um amuleto, um objeto mágico, até como fonte de promessas em caixinhas que fornecem uma palavra para o dia. No fim, sobra aquilo que pode ser traduzido num tipo de mensagem de autoajuda. 

Diante de todas as maneiras equivocadas de se aproximar das escrituras, há quem diga que o importante é que as pessoas estão lendo. Não discordamos totalmente disso. Porém, se há uma mensagem, um enredo mais amplo e coerente contida ali, devemos buscar esse entendimento. Afinal, como é reconhecido na tradição cristã, trata-se da revelação de Deus a nós. Isso nos coloca diante da pergunta fundamental: o que Deus deseja nos revelar por meio das escrituras?

Vamos começar com a dica de um livro que certamente é o que há de melhor para ajudar todo aquele que deseja compreender a essência da revelação de Deus nas escrituras. CLIQUE AQUI.

quarta-feira, 9 de junho de 2021

Teologia

Você já pensou em estudar teologia?

Fazer teologia consiste em adentrar o mundo real. Ao mesmo tempo consiste em redescobrir o mundo encantado que as crianças conhecem melhor do que os adultos. 

É quando conseguimos enxergar a verdadeira realidade que nos encantamos. É olhar a vidraça e saber que ela está lá, mas, o que contemplamos mesmo é aquilo que podemos ver através dela. 

Ao contemplarmos um belo quadro podemos focar na arte imediata. Mas, podemos nos entregar também à imaginação, às perguntas pelo autor da obra, sua vida, momento, mensagem, recado. 

Ao escutarmos uma bela canção, podemos nos deixar embalar em sua bela melodia. Mas, podemos também sentir com o poeta. Sermos tocados por algo que transcende a letra e o som. 

A teologia brota da contemplação do mundo que se descortina diante de nós. Jardins, cascatas, mares, montes e pássaros. Sons e cores que manifestam vislumbres de um autor que se revela, mas, nem todos estão atentos. 

O autor da vida se revela. Podemos acreditar no quadro sem pintor ou na poesia sem o poeta. Não parece sensato. Para ser teólogo é preciso crer no jardineiro por trás do jardim. 

Além da criação, o divino se revelou também no humano. O carpinteiro por trás da madeira trabalhada passou pela manjedoura humilde e se tornou mestre. O bebê encanta quem logo depois, diante da cruz se espanta. A revelação continua, testemunhada pela criação, erguida no Calvário, deixando o túmulo vazio.


"...pois o que de Deus se pode conhecer é manifesto entre eles, porque Deus lhes manifestou"
(Romanos 1.19)

sábado, 5 de junho de 2021

Igreja: missão e visão



A tua igreja local possui uma declaração da missão? 

Você saberia recitar essa missão de cabeça? 

Nas últimas décadas se tornou comum as igrejas aderirem às declarações de visão e missão. Junto veio a crítica de que isso seria algo do mundo corporativo sendo integrado às igrejas. 

Declarações quanto à visão e à missão, uma lista de valores, objetivos e metas remetem ao planejamento estratégico, tão comum nas empresas. Muitas pessoas, inclusive, sequer entenderam a diferença entre missão e visão. Talvez, porque não seja mesmo assim tão claro. A bibliografia disponível não é assim tão consensual a respeito das definições. 

Falar em missão na igreja não é nada novo. Porém, quando uma igreja decide trabalhar no seu planejamento estratégico e passa a confeccionar uma declaração de missão, será que se trata da mesma missão histórica da qual sempre se falou? A resposta é SIM

A missão da igreja não pode ser outra do que a missão de Deus. Logo, uma declaração de missão nada mais é do que o resultado do esforço em resumir numa frase curta a missão de Deus por meio da Igreja. O propósito consiste em ajudar toda a igreja a estar consciente dessa missão, da razão de ser da igreja. 

A missão de Deus consiste em redimir a sua criação. A igreja, o povo de Deus, é enviada ao mundo para testemunhar do amor de Deus, anunciando a boa notícia e fazendo discípulos de Jesus. Esta não é apenas uma missão para a qual algumas igrejas são chamadas a se envolverem. É a missão para toda a Igreja de Jesus. Assim, quando falamos de uma declaração de missão estamos falando do propósito de Deus para toda a Igreja. 

A visão, por sua vez, seria algo mais específico. Seria algo específico sobre os propósitos de Deus para uma determinada congregação situada num determinado contexto e num período de tempo bem delimitado. Logo, trata-se de algo bem estratégico. Depende de discernimento quanto à realidade e contexto local. 

A missão responde à pergunta sobre o que Deus espera de sua Igreja

A visão responde a pergunta sobre o que Deus deseja fazer nos próximos anos por meio de nossa igreja local ali onde estamos inseridos. Onde e como queremos estar daqui a três ou cinco anos? 

Apesar das críticas, trabalhar nesse tipo de declaração e num planejamento para a igreja é extremamente importante. Se Deus deseja algo por meio de sua igreja neste mundo, cabe, então, a nós, discernirmos a vontade divina, termos clareza de sua missão no mundo e, nos juntarmos ao que Deus já está realizando. Para isso, um bom planejamento fornece clareza, discernimento e foco. 

Por onde começar? 

É preciso começar pelo óbvio. Sem conhecermos quais são os propósitos de Deus, o que Ele está fazendo, estaremos apenas nos enganando em nosso ativismo religioso. É preciso começar pelas Escrituras. 

Qual é a missão de Deus? 

No caso da visão, depois de obtermos clareza da missão de Deus, devemos também conhecer muito bem a realidade local. Será necessário um estudo sério e abrangente da comunidade, seu contexto e realidade. O que Deus deseja fazer por meio de nossa igreja local? 

Preciso dizer ainda mais uma coisa. Depois de obtermos clareza quanto à missão de Deus e a visão da igreja local, restará mais um desafio: transformar isso numa frase sucinta, clara, objetiva e que remete à ação. Declarações complexas, muito longas, abstratas, com palavreado muito teológico ou acadêmico acabarão não fazendo mais do que enfeitar a parede numa moldura bonita. Simplifique. Objetividade é tudo. 

E a tua igreja, ela possui esse tipo de declaração? 
Você a conhece e conseguiria recitar de cabeça? 
Na tua opinião ela é eficaz ao que se propõe?

sexta-feira, 21 de maio de 2021

Vocação Também é uma Questão de Perspectiva

Há quem veja religiosidade na definição da palavra vocação. Estão corretos. 

Há religiosidade em tudo. Isso, porém, nem todos veem. 

Nossa visão de mundo está baseada em crenças que assumimos antes mesmo de fazermos qualquer tipo de análise mais metódica das coisas. 

No caso de uma definição para a palavra vocação, no entanto, não precisamos ficar em achismos ou suposições genéricas. 

Sim. Vocação significa chamado. A origem latina remete a termos como vox, vocatio e vocare

O desconforto de alguns começa quando dizemos que se há um chamado, então, é preciso perguntar por aquele que chama. Quem chama? 

O passo seguinte consiste em perguntar pelo motivo do chamado: para o que sou chamado, afinal? 

Não importa se há ou não concordância quanto à natureza essencialmente religiosa do ser humano. Aquilo que fazemos só fará sentido e trará realização quando visto dentro de um contexto mais amplo. 

Uma perspectiva correta poderá evitar muita frustração e perda de tempo!
 

terça-feira, 18 de maio de 2021

Criados Para Outro Tipo de Realidade

Existe uma condição da nossa realidade que nos diz que toda essa experiência que vivemos ainda não é tudo. 

O famoso autor, pensador cristão, conhecido pelas Crônicas de Nárnia, C. S. Lewis disse que: 

“Se descubro em mim um desejo que nenhuma experiência deste mundo pode satisfazer, a explicação mais provável é que fui criado para um outro mundo” 

O que isso quer dizer!? 

Você também já experimentou aquele sentimento como uma espécie de saudade de alguma coisa que você não sabe ao certo o que é? 

Sentimos saudades de tempos que foram bons e alegres em nosso passado. Sentimos saudades de pessoas queridas que nos deixaram. Mas, é possível sentir saudades de algo que não vivemos? 

Talvez, neste caso, a melhor palavra não seja saudades. Mas, o sentimento de uma ausência, aquela sensação de que falta alguma coisa. Um tipo de intuição que parece nos dizer que aquilo que estamos vivendo ainda não é tudo. Enquanto a saudade nos remete ao passado e nos deixa angustiados por algo que se perdeu, este outro sentimento vive entre um passado mais distante e um futuro desejado, mesmo que não muito consciente.

Se pensarmos nos seres humanos que foram expulsos do jardim do Éden depois da Queda, poderíamos imaginar que sua vida, depois disso, envolveu alguma saudade daquilo que perderam. Da mesma forma o povo de Israel, ao ser exilado, vivendo sob o domínio de povos estrangeiros, sentia falta dos bons e velhos tempos quando Deus era mais presente. 

Junto aos rios da Babilônia nós nos sentamos e choramos com saudade de Sião” (Salmos 137.1) 

O Salmo revela o estado de espírito dos judeus que viviam em uma terra estrangeira, um lugar no qual não se sentiam em casa. 

Já vimos, conforme os posts anteriores, que a condição humana após a Queda envolve inimizade, idolatria e escravidão. Há, no entanto, ainda mais um aspecto dessa condição: exílio. 

A realidade de domínio, extradição e exílio espalhou os judeus pelo mundo da época. Sua condição de estrangeiros, sob o domínio de senhores pagãos, fazia crescer o desejo por serem governados pelo único e verdadeiro Deus. 

Enquanto o pecado marcar a realidade, enquanto estivermos sob os efeitos da Queda, seremos o povo de Deus vivendo a expectativa da plena manifestação do reino de Deus. Não haverá lugar ou templo feito por mãos humanas capazes de preencher este anseio de nossos corações. 

No vídeo abaixo detalhamos um pouco mais esta nossa condição de exilados que anseiam retornar ao verdadeiro lar.

domingo, 16 de maio de 2021

Uma escravidão total exige uma libertação total

Uma das grandes barbaridades que encontraremos na história da humanidade é a escravidão de seres humanos por outros seres humanos. Essa situação já foi pior. O que não significa que hoje não existam mais casos de escravidão.

Os textos anteriores abordam a condição humana que torna a vinda de Jesus necessária e significativa.

Após a Queda, relatada em Gênesis 3, a humanidade entrou num estado de inimizade e rebelião contra Deus. E, apesar de Deus ter proibido a confecção e adoração de imagens, o ser humano caído revela um coração idólatra.

O Antigo Testamento nos ajuda revelando ainda mais uma faceta desta condição humana caída: somos escravos. 

Toda esta condição humana e o pecado, com suas consequências no mundo, levaram à necessidade de redenção. Em sua graça, misericórdia e amor, Deus não desiste de sua criação. 

O especialista em Antigo Testamento, Christopher Wright, fala do Êxodo como uma modelo de redenção no Antigo testamento. A libertação operada por Deus foi integral, envolvendo todos os aspectos da vida. 

Perguntar para um Israelita dos tempos bíblicos do Antigo testamento se ele era redimido seria escutar, como resposta, um 'sim'. 

Com o teu amor conduzes o povo que resgataste (redimiste); com a tua força tu o levas à tua santa habitação” (Êxodo 15.13) 

De que tipo de situação os israelitas foram libertados do Egito? 

Observando como era a vida do povo debaixo da escravidão e opressão do faraó, compreenderemos a abrangência da ação redentora de Deus. 

O vídeo abaixo procura detalhar os aspectos da condição escrava e da libertação operada pelo Senhor.

 

sábado, 15 de maio de 2021

Ídolos: o problema com a idolatria

Quem é o teu ídolo? 

A palavra ídolo é muito utilizada. Na música e nos esportes existem os ídolos. Aquelas pessoas que se destacam, que alcançam fama, sucesso e fortuna. 

Outro contexto onde a palavra é comum, encontraremos no mundo religioso. 

Bíblia também fala dos ídolos. Idolatria é um tema comum. Aparece como algo tão sério que Deus, nos Dez Mandamentos, inclui a mensagem de que o povo não fizesse imagens para representar o Senhor.

Não terás outros deuses além de mim. Não farás para ti nenhum ídolo, nenhuma imagem de qualquer coisa no céu, na terra, ou nas águas debaixo da terra. Não te prostrarás diante deles nem lhes prestarás culto” (Êxodo 20.3-5) 

Qual seria o mal em ter um ídolo? 

Por que a idolatria é um pecado? 

O detalhe que chama a atenção nesta passagem se destaca por causa de outro verso do Antigo Testamento. Uma palavra que já encontraremos no relato da Criação: 

Criou Deus o homem à sua imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou” (Gênesis 1.27) 

Será que Deus nos proíbe de fazer imagens porque já existe a imagem de Deus no mundo? 

Este é o nosso tema no vídeo abaixo. Ao lado da inimizade, da escravidão e do exílio, a idolatria é outra condição humana após a Queda.
 

sexta-feira, 14 de maio de 2021

Deus é nosso inimigo?

Em nosso post anterior abordamos as quatro condições da humanidade que definem a realidade humana pós queda. 

Nos encontramos numa situação de quem precisa ouvir e receber uma notícia boa. 

Dissemos que esta condição implica em inimizade, idolatria, escravidão e exílio

Começando pela inimizade, produzimos outros vídeos para tratar mais detalhadamente cada uma dessas situações. 

Deus criou todas as coisas. Sua avaliação foi sempre a de que as coisas ficaram boas. O bom inclui beleza, harmonia, equilíbrio, justiça, amizade, alegria, confiança, saúde, fertilidade, paz... Tudo isso formam o shalom: um ambiente de plena presença de Deus. 

A criação oferecia tudo de forma rica, integrada, para o desenvolvimento de uma vida plena. Quando nós olhamos para o mundo hoje vemos que alguma coisa deu errado. Os conflitos, as pandemias, a violência, a corrupção, a injustiça, a degradação ambiental, a mentira, nada disso deveriam existir. No entanto, é o que mais se vê no noticiário todos os dias. E, sejamos realistas: não precisamos do noticiário para percebermos essas coisas. 

Basta sairmos às ruas, caminharmos por aí e prestar atenção à realidade. O coração fica apertado ao vermos crianças vendendo doces nas sinaleiras, moradores de rua tratados sem dignidade, pessoas sofrendo e, até morrendo, a espera de um leito de hospital. Pessoas com depressão. Suicídios. Brigas familiares, muitas vezes, pelos motivos mais banais. Mentiras, golpes, egoísmo. E, mesmo que não foquemos nos noticiários e nem a realidade à nossa volta, basta um exame sincero de nossa própria vida, de nossos pensamentos, para constatarmos que não, o mundo não permaneceu naquela condição muito boa com a qual Deus o criou. 

O que aconteceu? 

Nas palavras do teólogo holandês, Herman Bavinck: 

“O pecado arruinou toda a criação, convertendo sua justiça em culpa, sua santidade em impureza, sua glória em vergonha, sua bem-aventurança em miséria, sua harmonia em desordem e sua luz em trevas” 

O ser humano não se sente mais confortável e à vontade na presença de Deus. Alguma coisa passou a interferir no relacionamento entre Deus e os seres humanos. Uma inimizade se instala. Deus já não é mais visto da mesma maneira que antes. E esta rebelião contra Deus afeta todas as relações humanas. O que antes, em Deus era harmonia, agora, com o pecado, é separação. 

No vídeo abaixo falamos sobre as quatro dimensões das relações humanas que foram afetadas pela queda gerando inimizade em todas as esferas.
 

terça-feira, 4 de maio de 2021

As Quatro Condições de Uma Humanidade Que Precisa de Boas Notícias

Quantas vezes você já escutou a frase 'só Jesus Cristo salva'? 

Já se tornou famoso um fato que teria ocorrido numa certa cidade dos Estados Unidos. Alguém pichou no muro a frase: JESUS CRISTO É A RESPOSTA. No outro dia as mesmas pessoas que tinham visto aquela frase no muro, se depararam com outra pichação logo abaixo: QUAL É A PERGUNTA? 

Se Jesus Cristo é a resposta, qual seria a pergunta? 

Se Jesus Cristo salva, Ele salva de que? 

Qual é a condição humana da qual Jesus Cristo veio nos salvar? 

Qual é a pergunta que Jesus veio responder? 

Nem sempre o Evangelho é apresentado de maneira clara e convincente. Deus conta com a sua Igreja para testemunhar a mensagem do Evangelho. Nós, porém, somos falhos, limitados e negligentes. 

Um dever de casa que nós precisamos fazer consiste em compreendermos bem qual é a condição humana da qual precisamos ser resgatados. Palavras como resgate, redenção, salvação e restauração remetem à obra de Cristo. Porém, essas mesmas palavras só farão sentido para quem compreende que sua situação é de alguém que precisa ser salvo, redimido, resgatado. 

A mesma Escritura que nos apresenta Jesus Cristo como o Salvador e Redentor, também nos ajuda a compreender qual é a nossa real situação. 

Numa definição curta, a palavra Evangelho significa boa notícia. Assim, o Evangelho de Jesus Cristo é a boa notícia de Deus para o mundo. 

Uma notícia é boa o quanto pior estiver a situação de quem escutará a boa nova. O Evangelho é uma boa notícia porque nos encontra num mundo que vive imerso em notícias ruins. 

As quatro condições da humanidade que tratamos no vídeo abaixo definem a nossa situação. Uma situação de quem precisa ouvir e receber uma notícia boa.

quinta-feira, 22 de abril de 2021

Quem é o Seu Ananias?

 

Há quase dois mil anos atrás, numa região distante de nós, vivia um homem enérgico e falador. Porém, não era muito atraente e, por suas origens, costumava ser desprezado. Sua vida consistia em viajar de cidade em cidade, enfrentando muitos perigos e ameaças para anunciar uma poderosa mensagem capaz de transformar vidas. Mas, nem sempre foi assim.A história de Paulo começou como Saulo. Cresceu numa casa onde aprendeu, desde criança, a se localizar em diferentes textos. A Torá, que conhecemos hoje como os primeiros livros da Bíblia, logo lhe foi apresentada. Coisa comum numa antiga casa judaica. Uma casa onde havia a prática de orações e a celebração das festas tradicionais de seu povo. Saulo cresceu como um religioso que se empenhava com zelo por sua tradição. 

Como costuma acontecer nas religiões, o judaísmo da época apresentava suas próprias linhas de pensamento. Saulo caminhou por uma proposta mais zelosa, mais radical, empenhada em garantir um judaísmo puro, fiel à Torá. Para isso, os ímpios teriam que ser duramente combatidos. Para o zelo religioso de Saulo de Tarso, o movimento em torno de um tal Jesus era algo perigoso demais e deveria ser combatido. As coisas espalhadas por homens como Estevão eram considerados um verdadeiro veneno, perigoso demais para ser tolerado. Saulo assiste impassível seus homens apedrejarem até a morte aquela ameaça ao Templo de Jerusalém. As coisas, porém, ainda se complicam muito mais. Imagine que os seguidores daquele galileu, agora, já se agitam anunciando que o crucificado ressuscitou. 

Saulo se empenhava com todo o seu zelo contra esta ameaça ao Templo de Jerusalém. Os primeiros cristãos logo ouviriam falar do impiedoso perseguidor que percorria os vilarejos atrás dos seguidores do Caminho. Não era fácil para eles acreditarem que aquele homem implacável havia mudado. Saulo se torna Paulo quando compreende que o Deus de Abraão, Isaque e Jacó finalmente fez aquilo que sempre dissera, como aparece na tradição. Paulo entende que a Escritura se cumpre. Sim, ela se cumpre como talvez nem mesmo o zeloso e estudioso Saulo poderia imaginar. 

O impacto daquele evento na estrada de Damasco fez com que o homem iluminado, conhecedor meticuloso das leis, de repente se visse cego, ofuscado por uma realidade que mudaria o mundo. Saulo é tomado pela mão pelos companheiros. Precisa se deixar conduzir para algo novo que estava para se descortinar diante dele. A quem caberia o desafio de ser o mentor nesta nova fase da vida de Saulo? 

Enquanto as coisas aconteciam na estrada de Damasco, Deus já orientava um homem chamado Ananias, encarregado de introduzir Saulo em diversos temas que modelarão sua vida e sua obra daí para frente. Como é característico dos discípulos fiéis e obedientes, Ananias segue para cumprir aquilo que Deus lhe pede. Com alguma ansiedade, preocupação e nervosismo, é verdade, mas, ele segue em frente a fim de cumprir a missão. Encontra Saulo orando e o saúda. Chama-o de irmão. Depois de três dias de turbulência e cegueira, Saulo é apresentado ao seu mentor. Aquele que o ajudaria e o guiaria para uma nova jornada. Surge Paulo. Algo como escamas caem de seus olhos. É batizado. Ele está preparado para passar alguns anos sendo moldado para um novo desafio. 

Paulo é autor de boa parte daquilo que hoje conhecemos como o Novo Testamento. Foi um instrumento precioso nas mãos de Deus a espalhar o Evangelho no mundo antigo. Sua influência e seus escritos atravessaram os séculos e causam impacto ainda hoje, como poucos escritos são capazes. Assim, Deus continua conduzindo a história por meio de homens e mulheres que, de repente, se dão conta de que algo maior está acontecendo. O risco é interpretarmos os tombos pelo caminho como meros acidentes ocasionais. 

Chega o momento em nossas vidas em que precisamos nos deixar conduzir e orientar para novos desafios. Deus usou o apóstolo Paulo de forma tremenda para mudar a vida de muitas pessoas. Antes, porém, existiu um Ananias que estava disposto a se deixar usar por Deus para abençoar a vida de Paulo. Todos nós, em nossa jornada, precisamos de pessoas dispostas a nos tomar pela mão, e caminhar conosco, indicando e orientando os rumos. Quem é o seu Ananias? 
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Leia a cativante reconstrução da vida do apóstolo Paulo feita pelo mais importante teólogo do Novo Testamento da atualidade, N. T. Wright:  



quarta-feira, 21 de abril de 2021

O Que Fazer Enquanto Jesus Não Volta?

Se o que importa mesmo é o céu, para onde os cristãos acreditam que irão, um dia, o que estamos fazendo aqui ainda? 

Céu. Eternidade. Reino de Deus. Será que sabemos mesmo do que estamos falando quando mencionamos essas coisas? Quando, afinal de contas, começa esse tal reino de Deus? 

Se o propósito de Deus é que os cristãos herdem e vivam em seu reino, o que nós ainda estamos fazendo aqui? 

Há quem não acredite que eu esteja fazendo uma pergunta dessas. Afinal de contas, a resposta para tudo isso é evidente: 'nossa missão aqui é o de evangelizar. Garantir que o máximo de pessoas se convertam e possam, também irem para o céu'. 

Sim. Evangelizar é parte da chamada grande comissão: 

"vão e façam discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a obedecer a tudo o que eu lhes ordenei" (Mateus 28.19,20) 

Pensando bem, o que Jesus ordenou é mais amplo do que 'evangelizar'. Na verdade, o que ele manda a igreja fazer, no texto de Mateus, é discípulos: "façam discípulos". 

Discípulo faz discípulo. E, mais o que? Afinal de contas, vivemos num determinado momento histórico, temos família, fazemos parte de uma sociedade, existe toda uma realidade social, política e econômica. 

Como os discípulos de Jesus devem lidar com tudo isso? Será que a Palavra de Deus tem algo a nos dizer a respeito? 

Parte integrante do discipulado é aprender sempre. Uma das coisas que Jesus mais fazia em seu relacionamento com os doze discípulos era lhes ensinar, reorientar o seu entendimento das coisas. 

As parábolas de Jesus apontavam para o reino de Deus. Por isso, acreditamos que elas contém muito ensinamento precioso para a igreja, os discípulos de Jesus hoje. 

O que a famosa parábola dos talentos (Mateus 25.14-30 ) teria a nos ensinar a respeito de como os cristão devem viver enquanto aguardam o retorno de Cristo?
 

terça-feira, 20 de abril de 2021

O que é o Evangelho? O que o Evangelho NÃO é?

Muitas vezes, para sabermos o que é uma determinada coisa, é importante sabermos também o que esta coisa não é. 

Quando se trata do Evangelho de Jesus Cristo esta é uma verdade importante. A palavra 'evangelho' é amplamente utilizada nos dias atuais. Abusada, desgastada, distorcida, banalizada. Em muitos casos, tem se colocado o significado mais conveniente. 

O que é o Evangelho, afinal? 

Não. Evangélico não é um termo utilizado somente por uma igreja evangélica. Aliás, sequer existe uma igreja evangélica homogenia como muitos, talvez, chegam a pensar. 

Evangelho também é algo mais do que uma maneira de se referir aos quatro primeiros livros do Novo Testamento: os Evangelhos. 

Como poderíamos definir o que é o Evangelho? 

Seria uma mensagem? 

Será que podemos afirmar que toda mensagem, toda pregação que acontece nos templos cristãos todos os dias ao redor do mundo, seria o Evangelho? 

A esta altura alguém já respondeu: Evangelho é boa nova, é boa notícia

A resposta está correta. Ainda assim, alguém poderia questionar: Mas, afinal, qual é a boa notícia? E, por que ela é boa? 

Em tempos de banalização e de testemunhos duvidosos, cabe a reflexão: o que é o Evangelho? 

Os vídeos abaixo se propõe a resgatar a compreensão bíblica daquilo que é o conteúdo do Evangelho. Incluímos também outro vídeo para afirmar aquilo que o Evangelho NÃO é como recurso útil para depurarmos a nossa compreensão.

 

domingo, 18 de abril de 2021

Sacerdócio Geral de Todos os Cristãos

O que significa testemunhar o Evangelho? 

A compreensão do testemunho do Evangelho costuma ser reduzida a falar diretamente de Deus, citar versos da Bíblia, até mesmo convidar pessoas para a programação da igreja. 

Felizmente, é muito mais do que isso. Quando nos referimos ao Evangelho, então, sim, é fundamental que utilizemos palavras. O Evangelho precisa ser anunciado, precisa se pregado para que as pessoas o conheçam em termos daquilo que Deus, por meio de Jesus Cristo, realizou. 

O testemunho cristão, no entanto, vai muito além de uma religiosidade que se manifesta esporadicamente na vida do crente. A presença da igreja no mundo consiste em que ela seja uma benção para todas as pessoas, para toda a criação de Deus. 

Em Martim Lutero encontraremos isso na formulação do sacerdócio geral de todos os cristãos. Trata-se de um preceito bíblico, coerente com a revelação das Escrituras.

Vocês, porém, são geração eleita, sacerdócio real, nação santa, povo exclusivo de Deus, para anunciar as grandezas daquele que os chamou das trevas para a sua maravilhosa luz

(1 Pedro 2.9)


Infelizmente, também o sacerdócio geral acabou, para muitos, sendo reduzido em seu significado. Assim, passou a ser compreendido como a possibilidade de membros da igreja participarem dos serviços religiosos no templo. Não somente os clérigos como pastores e padres ordenados, mas, todo e qualquer membro estaria autorizado a assumir tarefas na condução dos trabalhos e atividades da igreja. 

Diante de tal reducionismo carecemos de resgatar o verdadeiro sentido do sacerdócio geral bem como do chamado e missão da igreja para ser uma fiel testemunha enquanto povo de Deus neste mundo.

  Acompanhe um vídeo que fizemos a respeito do tema:

sábado, 17 de abril de 2021

O Mundo Não Vai Acabar

Volta meia aparece alguém anunciando o fim do mundo. O fato de ainda estarmos aqui é porque os arautos do apocalipse tem uma coisa em comum: todos estavam mentindo. 

Por falar em apocalipse e fim do mundo, o livro da Bíblia que chamamos de Apocalipse é um dos que mais as pessoas evitam. As razões são, basicamente, duas: primeiro porque consideram que é um livro difícil de entender e; segundo, o medo que as pessoas tem a respeito do que vão encontrar lá. 

Mas, e se eu te disser que todas as previsões sobre o fim do mundo vão continuar falhando? 

O medo que temos a respeito das coisas catastróficas que anunciam um possível fim do mundo está baseado em muitos equívocos. Infelizmente, além de todas as falsas previsões que ajudam a aterrorizar as pessoas, há também muitos cristãos que ajudam a disseminar falsas profecias. 

De todas as doutrinas cristãs, talvez a escatologia, que trata a respeito das coisas do fim, seja a mais controversa. 

O que é escatologia, afinal? 

Mais do que simplesmente uma doutrina do fim do mundo, trata-se da consumação dos propósitos de Deus para a sua Criação. 

Engana-se quem acha que apocalipse, armagedon, escatologia, fim do mundo e coisas do tipo sejam temas exclusivos das religiões. O mundo da ficção científica, da ciência e da filosofia também apresentam suas narrativas em torno do tema. 

Não se engane, com todo esse período de pandemia mundial em torno da COVID o tema do fim do mundo retornou com força em todos os círculos. O oráculo do Google nunca ofereceu tantas respostas e teorias para tantas pessoas que ali buscaram alguma informação. 

O motivo de existirem tantas previsões e tanto sensacionalismo é porque nós, os seres humanos, gostamos desse clima de tensão e iminência de algo novo que estaria por acontecer. 

Diante de toda especulação e das teorias da conspiração, no entanto, a segurança está na compreensão bíblica a respeito de como e para onde Deus está conduzindo todas as coisas. 

Portanto, não, o que a Bíblia ensina é que o mundo não vai simplesmente acabar. Temos algo mais a dizer sobre isso. Nos acompanhe no vídeo:

quinta-feira, 15 de abril de 2021

Missão Não é Pra Mim!

Existem três maneiras de você se envolver com a missão: 

indo, orando e contribuindo.

Você também já escutou essa frase?

Preciso confessar que ela sempre me incomodou. No entanto, demorou um tempo até que eu realmente conseguisse perceber o problema.

Muitos cristãos apaixonados pela evangelização, empolgados com a missão e que se alegram em ver vidas sendo transformadas sentem-se como se a missão não fosse para elas.

Eventos com o tema 'missão' acontecem aos milhares todos os anos. O foco, geralmente, é algum país ou região distantes. A palestra fica com o missionário que está servindo em algum lugar exótico do planeta. Então, ele compartilha das suas aventuras no campo missionário.

A platéia fica maravilhada. Muitos sentem o desejo de participar daquilo que Deus está fazendo. O desafio acontece. Como você se envolverá com a missão?

Ao final, a sensação que fica é que tudo não passou de um evento de marketing e propaganda. O objetivo era fazer a igreja se sentir desconfortável e, até mesmo culpada por não orar mais, não contribuir mais e, especialmente, viver sua vida 'normal' num lugar confortável.

Por mais que este reflita um paradigma superado, ainda é a realidade em muitos igrejas.

Algumas igrejas locais, para apaziguar a consciência dos mais entusiasmados, criam grupos, secretarias, departamentos, agências missionárias. Se você não pode ir, seja por falta de vocação ou por medo, pode se envolver localmente. Como? Orando e contribuindo financeiramente para sustentar os missionários de verdade que se arriscam em lugares distantes.

Se você também sente certo desconforto com tudo isso, saiba que não está só.

O que há de errado nesse sistema?

Seria um erro orar pela missão e pelos missionários? Certamente que não.

Seria errado, então, auxiliar financeiramente pessoas que se dedicam à missão em outros lugares? Não. Nada de errado nisso.

O problema está no reducionismo que esse paradigma assume. Leva muitas pessoas, cerca de 99% das igrejas locais, a acreditarem que missão é coisa para alguns poucos especialistas. Restaria para essa ampla maioria se contentar em orar e contribuir. E, vamos ser sinceros, quantas pessoas realmente oram e contribuem?

Se o missiólogo David Bosch estiver certo e, como ele disse, “toda a existência cristã deve ser caracterizada como existência missionária”, o que haveria além de ir, orar e contribuir? 

 Convido você a assistir esse breve vídeo que produzimos abordando a diferença entre Missão e Missões:


sábado, 10 de abril de 2021

Igreja e Fake News*

Geralmente as pessoas relacionam as notícias falsas à era digital da internet e das redes sociais. No entanto, vamos mais devagar, pois aí já podemos estar acreditando em algo que não corresponde totalmente à verdade. Quem cria e propaga notícias falsas somos nós, as pessoas. Os meios podem até facilitar o processo, no entanto, há sempre alguém operando. A realidade é que notícias falsas são coisa muito antiga. Não precisamos atualizar o vocabulário ou importar estrangeirismos para compreendermos aquilo que realmente queremos dizer com Fake News. Trata-se, tão somente, da velha e bem antiga mentira. 


A primeira Fake News da história é relatada pela bíblia. O primeiro casal que Deus colocou no jardim recebeu orientações claras a respeito da árvore do conhecimento do bem e do mal (Gênesis 2.17). No entanto, a serpente veio colocar em dúvida as orientações de Deus. Quando, finalmente, o clima de suspeita estava instalado, veio a mentira: “Certamente não morrerão!” (Gênesis 3.4). Depois disso, a história da humanidade passou a ser marcada pela mentira, fofocas, boatos, calúnias e dissimulação. Isaías tinha clareza quanto ao mal que a língua pode produzir: “as suas mãos estão manchadas de sangue, e os seus dedos, de culpa. Os seus lábios falam mentiras, e a sua língua murmura palavras ímpias. Ninguém entra em causa com justiça, ninguém faz defesa com integridade. Apoiam-se em argumentos vazios e falam mentiras; concebem maldade e geram iniquidade” (Isaías 59.3-4). 

O termo Fake News tornou-se mais popular a partir das eleições americanas que elegeu Donald Trump presidente dos Estados Unidos em 2016. Mas, entrou definitivamente no vocabulário brasileiro em 2018. Assim, Fake News geralmente aparece associado a uma estratégia política utilizada em campanhas eleitorais. Consiste, basicamente, em criar e disseminar notícias falsas com intuito de gerar uma rejeição contra determinado candidato. Contextos políticos polarizados como foram as eleições presidenciais nos Estados Unidos e no Brasil, favorecem esse tipo estratégia. Isso porque a eleição costuma ser decidida não tanto pelo voto na melhor opção, mas, sim, no “menos pior”, ou seja, a eleição se decide com base na menor rejeição. As Fake News, portanto, fazem o papel de destruir ao máximo a reputação de alguém com o objetivo de gerar no eleitor a maior rejeição possível. Mas, não podemos nos restringir ao contexto político. É conhecido o efeito das Fake News também na área da saúde, da economia, da educação, das famílias e até mesmo da igreja. Vacinas são postas em dúvida quanto à sua eficácia; informações são criadas para impulsionar o preço de produtos e influenciar a bolsa de valores; a história é recontada segundo a versão que interessa a determinada ideologia; casais brigam e até se separam por causa de fofocas; líderes e pastores tem a reputação destruída por inveja e vaidade. 

Ao rejeitar o conselho e orientação de Deus, Adão e Eva deram início a tudo que acompanhamos e vivemos hoje em termos de mentiras e boatos. Se as pessoas criam e propagam notícias falsas, temos hoje uma tecnologia disponível que torna tudo mais rápido e fácil. Enquanto antigamente se observava da janela os acontecimentos e passava-se adiante a interpretação dos fatos de boca em boca, hoje, com grupos de Whatsapp e redes sociais, a fofoca foi elevada a um novo nível. É impressionante a criatividade e o tempo disponível para a criação de notícias falsas. Grandes interesses ocultos fazem com que haja pessoas dedicadas que, inclusive, são pagas exclusivamente para passarem o dia criando boatos que serão propagados na internet. Isso é possível porque sabem que milhões de pessoas estão prontas a passar adiante qualquer coisa que receberem sem se darem o trabalho de verificar a credibilidade da informação. 

Uma das coisas que facilitam a proliferação das Fake News é que elas parecem não ter origem. É muito difícil saber quem criou e de onde partiu. Outra característica desses boatos é que favorecem um clima de ‘nós contra eles’, ou seja, procura identificar os bandidos e os mocinhos do mundo. Como as pessoas, de modo geral, gostam de coisas espetaculares, caímos facilmente na tentação de compartilhar algo sem checarmos antes a veracidade da informação. Também gostamos de parecer atualizados e queremos ser os primeiros a informar amigos e familiares. E, claro, como nós gostamos de nos meter na vida alheia! Assim, tecnologia aliada à nossa natureza caída desenfreada constituem terreno fértil para todo tipo de boataria, calúnia e mentiras. Pode ser que nem tenhamos a intenção, mas, inadvertidamente compartilhamos adiante algo que, por não pararmos antes para refletir e questionar, está destruindo a reputação de alguém. 

Precisamos ser bem claros, portanto. O próprio Jesus também foi vítima das Fake News. Havia tantos boatos e acusações contra Jesus que em certo momento ele foi tirar a dúvida com os discípulos mais próximos: “E vocês, o que dizem?”, perguntou. “Quem vocês dizem que eu sou?” (Lucas 9.20). Jesus tinha uma posição muito clara frente às mentiras e à boataria. Ele reconhecia a fonte dessas coisas: "Vocês pertencem ao pai de vocês, o diabo, e querem realizar o desejo dele. Ele foi homicida desde o princípio e não se apegou à verdade, pois não há verdade nele. Quando mente, fala a sua própria língua, pois é mentiroso e pai da mentira” (João 8.44). O cristão, portanto, não só cuida para não criar mentiras e boatos como também cuida com aquilo que passa adiante. Existem meios para checar as fontes da informação e evitar que passemos adiante mentiras que destroem a vida de outras pessoas. 

Se, por um lado, é verdade que a mentira primordial levou a humanidade à queda, é fato também que a verdade irrompeu na história na pessoa de Jesus Cristo. A igreja, portanto, é um corpo de pessoas redimidas, cheias do Espírito Santo de Deus, capacitadas a imprimirem um novo rumo para suas vidas. Esse discernimento e compromisso com o Senhor da verdade faz de nós pessoas comprometidas com a verdade. Não podemos tolerar a mentira. Não podemos fazer de nossos perfis nas redes sociais, de nossas conversas pelo Whatsapp, algo dissociado de nossa identidade cristã. Não há espaço para uma vida paralela, por mais que o mundo virtual nos iluda quanto a isso. Pecado continua sendo pecado mesmo que atualizem a forma de se referir aos seus efeitos. O diabo que Jesus identifica como sendo o pai da mentira é o mesmo que hoje é o pai das Fake News. 

Existem apenas duas opções ao cristão: servir à verdade ou à mentira. Servir ao Senhor da verdade ou permanecer escravo do pai da mentira. “Aquele que pertence a Deus ouve o que Deus diz”, afirmou Jesus (João 8.47). Portanto, um cristão jamais se sujeita a ser um criador de notícias falsas, seja qual for a motivação. Se esta parece ser uma questão óbvia, a outra, parece não ser. Trata-se da propagação da boataria mentirosa. A pressa por dar o “furo” na notícia, a motivação por vezes sincera de alertar o outro contra algo aparentemente perigoso, o desejo de parecer engraçado e bem-humorado, e, sim, um desejo secreto de prejudicar alguém, podem surgir como armadilhas em nosso caminho. Além de contribuirmos para o mal, ao compartilhar notícias falsas podemos estar prejudicando o alvo da calúnia e também muitas outras pessoas que, assim como eu, estarão sendo usadas como canais de propagação da mentira. 

Existem muitos e grandes interesses por trás das notícias que circulam nas redes sociais e também nos grandes veículos da mídia. Nem sempre sabemos como nos posicionar em meio a esta verdadeira guerra de informações e narrativas. As Escrituras, no entanto, ainda nos servem de inspiração e apresentam princípios claros. Ao receberem a palavra, os bereanos examinavam tudo para ver se conferia com as Escrituras (Atos 17.11). Este exemplo pode se aplicar também quanto às notícias que a internet lança diante nós. Existem meios para investigarmos os fatos. O próprio Deus já preveniu quanto ao que se espera de seu povo frente às Fake News: "Não darás falso testemunho contra o teu próximo” (Êxodo 20.16). Na dúvida: “Excluir”. Se ainda estamos aprendendo a lidar com todas as novas tecnologias da informação, uma lição importante para começar é que nem tudo precisa ser compartilhado. 

 * Texto originalmente publicado na Revista MOSAICO, ano 04, nº 08 - março de 2019. Uma publicação semestral do sínodo Centro-Sul Catarinense (IECLB).